Ministro-adjunto britânico critica pressão argentina sobre ilhéus e recusa diálogo bilateral com o governo de Cristina

 

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Roberto Simon

vinheta-clipping-navalContra o argumento argentino de que os habitantes das Ilhas Malvinas/Falkland são colonos britânicos, o ministro-adjunto da chancelaria de Londres, Hugo Swire, reage com uma provocação: “Eles estão lá há mais tempo que a família Kirchner está na Argentina”. Em visita a São Paulo na semana passada, Swire, responsável no Foreign Office pelas relações com a América Latina e Ásia, rejeitou um diálogo direto entre Argentina e Grã-Bretanha, dizendo que os ilhéus devem ser envolvidos – coisa que o governo de Cristina Kirchner não aceita. O ministro-adjunto também falou ao Estado sobre a detenção em Heathrow do brasileiro David Miranda, companheiro do jornalista Glenn Greenwald.

Argentinos rejeitaram o referendo nas Malvinas/Falkland, em março, e britânicos recusam dialogar. Há uma solução política?

Foi um referendo dos próprios moradores das ilhas, o qual incluiu mais de 30 nacionalidades. O resultado: 99,8% votaram a favor de manter o status (britânico), três pessoas foram contra. Como um político eleito democraticamente, ficaria muito feliz em ter apenas três pessoas votando contra mim. Se você acredita nos direitos humanos e no direito à autodeterminação, então é preciso respeitar o desejo dos ilhéus.

Os argentinos não reconhecem a legitimidade do referendo, sob o argumento de que eles não foram consultados e essa população é britânica, portanto obviamente votaria a favor.

É claro que a Argentina não reconhece o resultado da votação. Mas alguns dos moradores dessas ilhas estão há oito ou nove gerações lá. Antes de muitas famílias que hoje são argentinas terem escutado falar na Argentina – incluindo, suspeito eu, os Kirchners. Há quantas gerações a família Kirchner está na Argentina? Esse argumento, de uma ‘população levada pelo colonialismo’, é falacioso. Outra falácia é a ideia de que a Grã-Bretanha está militarizando a região, como dizem os argentinos. Nunca houve tão pouca gente na base nas Ilhas Falkland. Podemos questionar por que há uma base lá, mas talvez essa é uma pergunta que você tenha de fazer aos argentinos. Além disso, os argentinos se retiraram de vários acordos bilaterais em temas como exploração de recursos naturais e pesca. Os moradores das ilhas são um povo pacífico e vulnerável em razão de sua localização geográfica. Eles não merecem ser espezinhado e intimidado por ninguém.

Mas é possível haver diálogo entre Buenos Aires e Londres?

O sr. Héctor Timerman (chanceler argentino) veio ao Reino Unido recentemente e disse que queria ver o secretário do Exterior (William Hague), que ficou muito feliz em poder recebê-lo, mas deixou claro uma coisa: se o sr. Timerman pretendia levantar o tema das Ilhas Falkland, nós não teríamos autoridade para discutir isso sem a presença de um representante da comunidade dos ilhéus. Nesse momento, o sr. Timerman desistiu de nos ver. Portanto, é nesse ponto em que estamos.

Em vários países sul-americanos, há dificuldades em entender por que, no século 21, um arquipélago da região, a milhares de quilômetros de Londres, deve ter soberania britânica. Como o sr. responde?

É preciso entender os fatos e a história das ilhas nos últimos séculos. Mas o principal é o que apontei: essas pessoas vivem lá, algumas há várias gerações, e democraticamente expressaram seu desejo de manter o status (britânico). Os ilhéus falaram de forma democrática e eu exorto países civilizados a respeitá-los. Não sou inocente e entendo a questão da solidariedade regional. Mas lhe digo que há vários países da região que não aprovam a forma como a Argentina sempre introduz o assunto de Falkland, em todas as cúpulas internacionais. Esses países reclamam para nós da forma como os moradores das ilhas são intimidados. E vale sublinhar que fazemos comércio com a Argentina, temos uma grande embaixada em Buenos Aires e relações extremamente boas com o povo argentino. Há, neste verão, 100 mil argentinos em Londres, por exemplo. É, portanto, uma questão com o atual governo (argentino).

E o Brasil pode ajudar nesse impasse?

Sim. O Brasil poderia ajudar argentinos a verem os fatos. E os ilhéus tentaram uma aproximação para ampliar o comércio e exploração de recursos naturais com brasileiros, algo que seria excelente.

Sobre o episódio com o brasileiro David Miranda, companheiro do jornalista Glenn Glenwald: por que ele foi preso por 9 horas, com base em leis antiterror, no Aeroporto de Heathrow?

Há uma investigação policial em andamento sobre a qual não posso comentar, mas o fato é que ele levava cerca de 55 mil documentos, alguns dos quais eram extremamente secretos. Esses dados foram apreendidos e ele agora é alvo de uma investigação policial. Discuti isso com o governo brasileiro e o secretário Hague deixou claro que manterá autoridades do Brasil informadas sobre qualquer avanço.

Mas do que ele é acusado?

É preciso esperar para ver isso. O fato é que ele carregava cerca de 55 mil documentos secretos e existe uma investigação policial, independente do governo, sobre o caso.

A Grã-Bretanha foi onde a democracia parlamentar moderna nasceu. O sr. vê um risco de leis britânicas antiterror violarem liberdades individuais ou mesmo regras do sistema democrático?

Acredito ser necessária uma série de pesos e contrapesos, e penso que o primeiro dever de qualquer governo é proteger seu povo. Mas, em um ambiente complexo como o de hoje, é preciso sempre ter em vista o outro lado e cuidar para não violar os direitos das pessoas. É por isso que, em nosso país, temos vários mecanismos de controle.

FONTE: estadao

COLABOROU: Henrique C.O.

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