O Centro de Informações de Combate (CIC - Combat Information Center) de um destróier da Marinha dos EUA dos anos 1960

A função básica do Centro de Informações de Combate – CIC (ou Centro de Operações de Combate – COC) nos navios de guerra é a coleta de dados de todos os sensores do navio para criar uma imagem tática do cenário e mostrá-la ao comandante e seus subordinados, a fim de possibilitar a tomada de decisões de comando e controle em tempo hábil para vencer o combate.

Durante a Segunda Guerra Mundial o radar foi usado pela primeira vez em campo de batalha para prover dados e possibilitar a visualização tática. Para processar a informação que vinha dos radares, foram criados os Centro de Informações de Combate, começando nos navios-aeródromo.

No início, os centros de informações eram conhecidos como Action Infotation Organization (AIO) na Royal Navy e Combat Information Center (CIC) na US Navy.

Em uma comparação, se os radares são os olhos do navio de guerra, o CIC é o cérebro, que julga o que os olhos vêem e move os punhos (artilharia e aviões) para acertar os alvos.

No início, o acompanhamento dos alvos era manual, feito com lápis de cera em um quadro transparente, que era atualizado à medida que operador recebia via fonia as informações do operador de radar.

Com poucos alvos na tela, era possível fazer o acompanhamento e o engajamento com razoável facilidade. Mas quando o número de alvos aumentava e a velocidade de engajamento crescia, ficava cada vez mais difícil atualizar o quadro tático e alvos eram perdidos, erros eram cometidos e, em combate, isso podia significar a diferença entre a vida e a morte.

No calor das situações de combate, o CIC foi apelidado de “Christ, I’m Confused” (Cristo, estou Confuso) na Marinha dos EUA.

Na Batalha de Okinawa em 1945, os CIC e AIO foram colocados à prova diante dos ataques Kamikaze japoneses. Independentemente do número de radares e operadores disponíveis, os CIC só conseguiam acompanhar até 12 alvos simultâneos.

Os Kamikazes atacando em grande número e voando a 600 km por hora, conseguiam saturar os CIC e ultrapassar as defesas, acertando escoltas e os porta-aviões.

No pós-guerra, com a chegada dos jatos a situação dos CIC se complicou ainda mais.

Centro de Informações de Combate do porta-aviões USS Hornet (CV-12), com as telas dos radares em primeiro plano e as rosas de manobra e quadros de informações ao fundo, onde eram plotados os alvos manualmente

Auxílio dos computadores analógicos

Os britânicos foram pioneiros na introdução de computadores analógicos eletromecânicos nos CIC/AIO dos navios de guerra, para auxílio no acompanhamento de alvos.

O primeiro, produzido pela Elliot Brothers e denominado CDS (Comprehensive Display System), foi instalado no porta-aviões HMS Victorious em 1957. O CDS automatizava o processo que antes era feito manualmente de rastrear alvos, armazenando por meio de switches as coordenadas X e Y dos alvos, alocando um número de identificação (track number), altitude do alvo e qual bateria/interceptador estava alocado para interceptá-lo.

O CDS foi instalado também em quatro destróieres antiaéreos classe “County” e no porta-aviões HMS Hermes.

O número de alvos simultâneos que podiam ser acompanhados pelo CIC/AIO subiu para 96. O CDS foi exportado pela Elliot Brothers para a US Navy, que acabou desenvolvendo sua própria versão totalmente eletrônica chamada EDS, produzida pela Motorola Corporation e instalada em vários navios.

EDS do Naval Research Laboratory da US Navy. Ao fundo, um quadro de plotagem automático

Chegam os computadores digitais

A Marinha Real Canadense foi a pioneira na introdução do computador digital no Centro de Operações de Combate dos navios. Os canadenses estavam cansados de serem comandados por americanos e ingleses na escolta de comboios nas guerras.

Então resolveram inovar, para na próxima guerra comandar os navios das outras Marinhas.

O DATAR da Marinha Real do Canadá, feito em parceria com a companhia Ferranti Canada

O DATAR, abreviação de Rastreamento Automático e Resolução, foi um sistema de informação de campo de batalha pioneiro e informatizado. O DATAR combinava os dados de todos os sensores em uma força-tarefa naval em uma única “visão geral” que era então transmitida de volta a todos os navios e exibida em indicadores de posição de plano semelhantes aos monitores de radar. Os comandantes podiam então ver informações de todos os lados, não apenas os sensores de seus próprios navios.

O desenvolvimento do sistema DATAR foi estimulado pelo trabalho da Royal Navy no Comprehensive Display System (CDS), com o qual os engenheiros canadenses estavam familiarizados. O projeto foi iniciado pela Royal Canadian Navy em parceria com a Ferranti Canada (mais tarde conhecida como Ferranti-Packard) em 1949.

Eles estavam cientes do CDS e de um projeto da Marinha dos EUA ao longo de linhas semelhantes, mas acreditavam que sua solução era superior, que eventualmente poderiam desenvolver o sistema em nome das três forças. Eles também acreditavam que o sistema poderia ser usado pela Força Aérea Canadense e a Força Aérea dos EUA para o controle aéreo continental.

Protótipo da Trackball do DATAR, o primeiro do mundo, que funcionava como um mouse nos atuais microcomputadores. Movendo a Trackball com a mão, o operador movia o cursor e selecionava os contatos apresentados

O protótipo do DATAR
Em 1950, a pequena equipe da Ferranti Canada havia construído um sistema de rádio de modulação de código de pulso (PCM) que conseguiu transmitir dados de radar digitalizados a longas distâncias. O início da Guerra da Coreia mudou drasticamente as prioridades de gastos do governo e 100 novos navios foram encomendados em 1951. Além disso, veio um interesse renovado no DATAR e, nos próximos dois anos, gastaram US$ 1,9 milhão (US$ 18 milhões hoje) em desenvolvimento de um protótipo. A máquina protótipo usava 3.800 válvulas eletrônicas e um tambor magnético para armazenar dados para até 500 objetos. O sistema poderia fornecer dados para 64 alvos com uma resolução de 40 por 40 jardas ao longo de uma grade de 80 por 80 milhas náuticas.

Em uma configuração de produção, apenas um navio em uma força-tarefa levaria o computador DATAR. Os demais navios teriam terminais de computadores que permitiriam que os operadores usassem uma trackball com base em uma bola de boliche canadense de cinco pinos e a acionassem para enviar informações de posição sobre os links do PCM para o DATAR. O DATAR então processava as localizações, traduzia tudo na visão local do navio e enviava os dados de volta para eles nos mesmos links do PCM. Aqui era exibido em outro console originalmente adaptado de uma unidade de radar. Em contraste com o Semi Automatic Ground Environment (SAGE) da Força Aérea dos Estados Unidos, o DATAR não calculava o rastreamento automaticamente, contando com os operadores para continuar alimentando novos dados no sistema à mão.

Testes no Lago Ontário

O sistema DATAR foi testado pela primeira vez no final de 1953 no Lago Ontário. Foi criado um comboio simulado, composto por uma estação costeira e dois varredores de minas da classe “Bangor”, HMCS Digby e HMCS Granby. O DATAR teve um bom desempenho, com todos recebendo exibições adequadas do radar e “blips” de sonar simulado. O teste foi um sucesso completo, e a Marinha ficou extremamente satisfeita. A única preocupação séria foi a taxa de falha das válvulas eletrônicas, o que significava que a máquina não ficava operacional por um período considerável de tempo. A Ferranti estava extremamente interessada em adaptar o sistema DATAR a um projeto baseado em transístores, o que eles acreditavam que iria resolver esse problema.

No entanto, o equipamento para toda a frota da Royal Canadian Navy seria extremamente caro. As máquinas de produção provavelmente seriam mais baratas que o custo do protótipo de US$ 1,9 milhão, se feito em qualquer tipo de produção. Para reduzir o custo total, a Marinha queria distribuir os custos de desenvolvimento em uma linha de produção maior e convidou os representantes da Marinha Real e da Marinha dos EUA a visualizar o sistema.

O HMCS Digby foi usado para testar o DATAR no Lago Ontário

Eles mostraram-se igualmente impressionados; um oficial dos EUA que estava muito surpreso, olhou debaixo do console de exibição, acreditando que a tela era falsificada. Mas, por mais impressionados que fossem, parece que eles sentiram que podiam fazer melhor por conta própria e não quiseram se envolver. A Marinha Real começaria a trabalhar em seu Comprehensive Display System (CDS) naquele ano sob a direção de Elliot Brothers, e a Marinha dos EUA no seu Sistema de Dados Táticos (NTDS) em 1956.

O projeto DATAR terminou assim com uma nota um tanto amarga. O sistema passou de um conceito para um protótipo funcional em menos de quatro anos, e foi por qualquer medida um sucesso completo. No entanto, o custo da implantação era simplesmente demais para a Royal Canadian Navy suportar sozinha, e eles decidiram simplesmente cancelar o desenvolvimento do sistema.

Felizmente, o trabalho não foi completamente desperdiçado. A Ferranti Canada usou o design DATAR básico em vários projetos, transistorizando-o no processo. O sistema acabou levando ao ReserVec de reservas de voo para companhias aéreas e ao mainframe Ferranti-Packard 6000.

VEJA NA SEGUNDA PARTE DA SÉRIE: O desenvolvimento dos sistemas ADA, ADAWS e CAAIS da Royal Navy

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Ateu Libertador

pq os radares ainda usam estes monitores redondos ao inves de telas de computador?

Bosco

Me lembro de ter lido que na década de 70 a USN ficou interessado na disposição da ponte de comando da nave estelar Enterprise.

MO

Porra Bozzoh, o passadiço da Entreprise ? entao acabou né, o passadiço da Enterprise é uma dos mais mixurucas que ja vi, tenada naquela porra, so um painel de ed, meia duzia de poltrona e uns sensores bem Mk uno mesmo viu …. kkkkkkkkkkkk

Bosco

Beleza Galante!
Aguardando ansioso.

Nunão

Ateu Libertador, as telas mostradas na matéria são de várias décadas atrás, esta é só a primeira parte.

O formato redondo vem do campo de busca dos radares: o centro é onde ele está posicionado, e em volta surgem os alvos plotados conforme a antena gira. O final da tela redonda representa o limite do raio atingido pelo radar (limitado pela sua potência e também pela curvatura do planeta, se estiver nivelado com a superfície).

Ainda hoje, com telas quadradas ou retangulares, pode-se representar num formato circular o raio de cobertura do radar.

Bosco

MO,
Houve evolução, mas o original era bem chinfrim mesmo. Tinha lugar só pro comandante, piloto, copiloto/navegador/tático, oficial de ciências, oficial de comunicações e oficial de engenharia.
No filme pro cinema acrescentaram um posto tático independente.
Mas vale salientar que daqui a 300 anos a IA vai ser dominante e não vão precisar de tantos consoles , painéis e botõezinhos. rsrss

MO

Boscaum, que no caso dela o tal oficiais de ciencias (viadagem da serie) era na verdade o XO

Acho que sobre o passadiço melhorzin so na classe Sovereign (NCC 1701 E) o resto parece US Navy, do fçetcher ao Burke, tudo passadiço quase igual rsssss

Willhorv

Caros colegas…vamos aguardar as próximas partes…
Lembro de ter visto uma matéria sobre um jornalista que acompanhou o DDG 1000 da USNavy…
Segundo ele, o CIC é a ponte de comando pareciam cenários de Star Treak ….
Deve ter realidade virtual, interface ihm totalmente integrada, telas flat e huds virtuais pra todo lado…
Kkkk

Alex Barreto Cypriano

Pra quem quiser ver as plantas (e fotos) dos CIC dos CV, CVE, BB, CA, DD, DE, da WWII pulem no site do HNSA e procurem as edições da CIC Magazine.

PRAEFECTUS

Meus caros amigos,

gostaria de esclarecer aos tripulantes mais novos do PN, que, por razões de confidencialidade, os CICs de navios de guerra em vários países geralmente não aparecem completamente nas fotos de notícias e filmes e produções de televisão. Afinal, posições importantes do CIC e de outras partes dos navios de guerra sempre são foco de atenção por parte de outras marinhas, adversárias ou não…

Em geral, o CIC é o grau mais informativo de exibição das capacidades multifuncional em grande escala de um navio, daí a curiosidade em se obter imagens do mesmo.

Grato

Ádson

“Off Topic”, fainas de logistica: https://www.youtube.com/watch?v=Qd_stahsNOE

Angelo

Comando Estelar ; o Ano é 2017 ; Faltam 5 ANOS LUZ para a primeira Corveta Tamandaré iniciar a navegação:

Capt Jack Aubrey

Atenção as 5 etapas do cic
Coleta
Filtragem
Apresentação
Avaliação
Disseminação
Me lembro como se fosse ontem… depois de quase 40 anos!

Bosco

Muito legal Capt jack!

Audax

Captain jack

Vc foi oriundo do CIORM OU EFORM? Sds

Capt Jack Aubrey

Audax, sou oriundo da EN… abs

Burgos

MO;
The espace !!!
The final frontier !!!
Tracker purinho !!!
Kkkkkkkkkkk

Bosco

MO, Mas acho que isso do “oficial de ciências” acumular as duas “funções” era só no caso da Enterprise original com o Sr. Spock (série clássica). Nas outras naves da Frota Estelar provavelmente havia um imediato que ficava junto ao comandante (de pé???) e um oficial de ciência ocupava permanentemente a estação de sensores de longo alcance. Vale salientar que também a estação de engenharia não era ocupada permanentemente mas só quando o engenheiro chefe Scott estava na ponte. De permanente mesmo havia o assento do comandante que era ocupado pelo comandante (Cpt. Kirk) ou pelo seu substituto (sempre havia… Read more »

Burgos

Assistia esse seriado no tempo da TV preto e branco, depois nos anos 80 que veio a TV colorida, muito bom seriado e na época com os “defeitos”visuais era o que dava pra fazer.?

Burgos

Começou nos idos dos anos 67 criado por Gene Rodenberry !!!

Ateu Libertador

Qual a chance que uma corveta ou fragata tem contra caças armados com misseis antinavio hj em dia?

ps

somente navios de escolta contra avioes, ou seja, sem nae envolvida

Bosco

Ateu,
Vai ser um “combate” do navio contra o (os) míssil (mísseis) já que o caça é um vetor do míssil do mesmo modo que um navio ou submarino.
As chances são grandes tendo em vista a capacidade bélica de um navio ser muito maior que a de um simples míssil, mas na dependência dos sensores e dos sistemas defensivos hard-kill e soft-kill do navio.
As chances do míssil é a mesma de um ninja suicida querendo matar o xogun e que pra isso tem que penetrar no castelo. Se passar despercebido ele consegue, se não, morre.

Ateu Libertador

Bosco,

qual a tua opiniao sobre este enfrentamento?

forca 1

nae do porte do a11, minas gerais operando um awacs

10 covetas com 100 misseis antiaereos cada um

o awacs controla os misseis lancados pela corveta, ou seja:

1 o awacs detecta o aviao inimigo
2 o awacs ordena o lancamento de missil antiaereo com alcance de 200km
3 o awacs guia o missil em direcao ao aviao inimigo

forca 2

avioes de um nae do porte do nimitz

os naes nao se encontram

pergunta:

a forca 1 consegue derrotar os avioes inimigos?

Fernando "Nunão" De Martini

Desculpe me intrometer, mas pra caber 100 mísseis antiaéreos, ainda mais com com alcance de 200km, tem que ser um navio do porte de cruzador, não de corveta.

Bosco

Ateu, A força 2 com o Nimitz ataca a força 1, certo? Bem, vamos ser um pouquinho mais realistas. A força 1 teria só 3 escoltas (fragatas com uns 48 mísseis de defesa de área cada, mísseis estes guiados por radar ativo e operando no modo cooperativo com o AEW e com 200 km de alcance). E ainda teria alguns aviões de defesa de frota. Vamos chutar uns 12 A4 modernizados. A Força 2 teria também uns 3 escoltas e uns 48 Super Hornets. A força 2 poderia atacar a Força 1 com um pacote de 18 “Super Hornets” cada… Read more »

Bosco

“há” 9 mísseis por navio e não “a”

Bosco

Só de curiosidade, só existe um míssil sup-ar no mundo que opera de modo cooperativo com o AEW, que é o SM-6 operando com o E-2D. O míssil SM-6 pesa 1,5 t e tem 400 km de alcance.
Ele pode ser utilizado contra alvos aéreos, balísticos, navios e alvos em terra.

Bardini

F-35B operando de um LHD e guindando os SM-6 dos Contratorpedeiros seria interessante.