Cinco invenções que influenciaram a Guerra Naval

Batalha de Trafalgar - Patrick O’Brien
Sérgio Vieira Reale
Capitão-de-Fragata (RM1)
Este artigo trata da história naval, mais especificamente, de cinco grandes invenções ocorridas entre a Antiguidade[1] e a primeira metade do século XIX, que influenciaram a guerra no mar.
A TRIRREME

Na Antiguidade, as guerras greco-pérsicas, ocorridas entre 490 e 480 a.C., foram motivadas pelas crescentes conquistas persas na Ásia Menor, que colocavam em risco os interesses dos gregos no Mar Egeu (localizado entre a Grécia e a Turquia).
Em 480 a.C., foi realizada a Batalha de Salamina, a mais importante batalha naval da Antiguidade. A vitória grega interrompeu a sequência de tentativas de invasão da Pérsia sobre a Grécia. Os gregos garantiram para si o uso do Mar Egeu e Atenas se tornou uma grande potência naval.
Nos primórdios, os navios de guerra eram de madeira e eram movidos pela força do vento ou pela força humana. As duas esquadras utilizavam a propulsão a remos. Eles também possuíam velas quadradas para poupar os remadores nas longas travessias.

As trirremes foram os principais navios de guerra daquele período. Uma trirreme grega possuía uma tripulação com 170 remadores, tinha em torno de 40 metros de comprimento e quatro metros de boca. O navio atingia uma velocidade máxima de sete nós. Contudo, não utilizava essa velocidade para o abalroamento, pois seria perigoso para a trirreme atacante ficar presa no navio adversário. Ela tinha três ordens de remos para aumentar a velocidade, ou seja, os remadores eram dispostos lado a lado e em diferentes níveis de bancadas. Os remos superiores tinham um comprimento maior.
Na proa da embarcação havia um esporão, principal armamento do navio, que era uma protuberância revestida de bronze com lâminas afiadas na ponta. Assim, era possível provocar avarias nos navios adversários, com o afundamento ou os tornando inoperantes.
ESPORÃO
O abalroamento, que combinava movimento e choque, estava associado ao uso do esporão. Sua principal função era perfurar o casco do navio adversário. O esporão também poderia ser empregado para atacar os remos da embarcação inimiga com o objetivo de restringir a sua capacidade de manobra.
A estratégia marítima ateniense foi atrair a esquadra persa para as proximidades da ilha de Salamina, localizada ao sul de Atenas, onde as condições de manobra eram desfavoráveis aos navios inimigos. Dessa forma, os persas não puderam envolver a esquadra grega. Consta que para cada navio grego tinham, em média, de 2 a 3 embarcações persas. A esquadra grega estava em grande desvantagem numérica. Entretanto, as trirremes gregas tinham uma arquitetura mais adequada para manobrar em águas restritas. Aquele período marcou o início do emprego de uma força naval organizada e das operações conjuntas pelas forças terrestres e navais.
O CANHÃO NAVAL

A guerra no mar só iria se modificar no final da Idade Média com o surgimento do canhão. No século XIV, durante a Guerra dos Cem Anos (1337-1453), entre a França e a Inglaterra, apareceu uma nova arma: o canhão. Devido ao seu crescente poder de destruição, produziu significativas alterações na guerra naval. Após o sucesso observado nos combates terrestres foram trazidos para bordo dos navios. Inicialmente, foram instalados na proa e na popa das embarcações devido à existência da propulsão a remos. Para sua instalação em maior número, forçou lentamente o abandono da propulsão a remos. Os primeiros canhões navais, de modo geral, só atiravam no momento anterior à abordagem. O projetil costumava ser uma pedra em forma esférica, que se fragmentava ao ser disparado, causando grandes danos à tripulação inimiga.
Eram eficazes em distâncias de 20 a 40 metros, principalmente contra combatentes ou avariando as velas do navio inimigo. Na tática, provocou a decadência da abordagem e do abalroamento. À medida que o calibre e o peso dos canhões aumentaram, surgiu a necessidade de construir um convés abaixo do convés principal, e fazer aberturas no costado para instalação dos mesmos pelos bordos. Por volta do século XVII, Gustavo Adolfo, Rei da Suécia, teve a ideia de instalar sua artilharia sobre rodas. Levado para bordo, o canhão sobre rodas teve que ser dotado de talhas para impedir que o mesmo corresse livremente pelo convés e para trazê-lo de volta à posição inicial de abrir fogo, devido ao forte recuo.
A VELA TRIANGULAR
Em meados do século XV, os portugueses inventaram a caravela. Este navio utilizava velas triangulares, que trouxe uma grande evolução na propulsão, pois possibilitava a navegação quase contra o vento e travessias maiores. Diferentemente das velas quadradas e trapezoidais que geravam a propulsão somente com o vento a favor.
A vela triangular revolucionou a guerra naval considerando a vantagem tática, que navegar quase contra o vento trouxe para as manobras no mar. A capacidade de mudar de rumo e a escolha do melhor momento para atacar e defender foram bastante otimizados.
A Batalha Naval de Trafalgar ocorrida em 1805, entre a esquadra inglesa e a esquadra franco-espanhola, resultou na vitória britânica e no fracasso do “Grande Projeto” de Napoleão Bonaparte, que era invadir a Grã-Bretanha. Vale ressaltar que esta foi a última batalha naval de navios com propulsão à vela.
O CRONÔMETRO NAVAL
Muitos navios afundaram e marinheiros morreram devido a graves acidentes por desconhecimento da longitude. Em 1707, navios de guerra da marinha britânica navegavam rumo ao Canal da Mancha. Os navios se perderam e naufragaram nas proximidades das ilhas Scilly.
Não é de hoje que qualquer ponto na superfície terrestre ou no mar pode ser localizado por meio de duas coordenadas geográficas – a latitude e a longitude – que são linhas imaginárias que se cruzam num ponto. Mas nem sempre foi assim.
Em 1492, Colombo só navegava pelo cálculo da latitude (paralelos). Ele seguiu um caminho reto no Oceano Atlântico por um paralelo até encontrar o continente norte-americano. O quadrante era o instrumento de medida angular utilizado, no século XV, para calcular a latitude pela altura do sol e medir o ângulo entre o horizonte e a estrela polar no hemisfério norte, à noite.
O conceito de longitude já era conhecido, porém, a sua imprecisão ainda era um grande problema para os navegadores. Esse problema da imprecisão só seria resolvido no século XVIII.
Para navegar com maior precisão, é necessário estabelecer duas coordenadas geográficas que se cruzem em um ponto: a latitude e a longitude. A latitude é a distância em graus, minutos e segundos da linha do equador para o norte ou para sul, podendo variar de 0° a 90°. A longitude é a distância em graus, minutos e segundos medida entre qualquer ponto da superfície terrestre e o Meridiano de Greenwich.
As longitudes variam de 0° a 180° no sentido oeste ou no sentido leste. A latitude era determinada medindo a altura da estrela polar. A altura da estrela polar em relação à linha do horizonte indicava diretamente o valor da latitude no hemisfério norte. Contudo, ao cruzarmos a linha do equador, a estrela polar deixa de ser visível.
Somente com o desenvolvimento do cronômetro é que foi possível determinar a longitude. Conhecendo a hora local de dois pontos na superfície terrestre, é possível usar essa diferença de tempo para o cálculo da distância em longitude que os separa. Até o século XVIII, um dos maiores desafios científicos da humanidade era estabelecer a longitude no mar.
Em 1714, depois de muitos naufrágios dos navios da Marinha Real, o Parlamento Britânico criou um prêmio milionário para quem descobrisse como determinar a longitude no mar. Somente em 1761-62 é que o problema da longitude foi praticamente resolvido.
O inglês John Harrison inventou um cronômetro com uma precisão aceitável para atender às exigências da navegação. Esse cronômetro era acertado com a hora do ponto de partida da embarcação. A longitude do ponto era calculada comparando a hora local com a hora que o cronômetro marca.
O HÉLICE NAVAL

Em 1836, o inglês Francis Smith e o sueco John Ericson inventaram o hélice para substituir as rodas de pás que ficavam nos bordos dos navios. Elas eram vulneráveis aos ataques dos navios inimigos e tiravam espaço para instalação dos canhões. Assim sendo, os navios perdiam capacidade ofensiva. Naquele período, os canhões ainda eram instalados somente pelos bordos. Em 1850, a França lançou o primeiro navio de guerra movido por hélice, o Napoleon. Os helices eram instalados na parte submersa da embarcação e não sobrecarregavam os motores.
Atualmente, os hélices dos navios de guerra e dos submarinos variam quanto ao tamanho, número de pás, nível de ruído produzido, material de construção e passo. O passo pode ser fixo ou varíável. O hélice de passo fixo tem um ângulo de pá constante e é mais simples, leve e menor custo. A hélice de passo variável permite ajustar automaticamente o ângulo das pás em voo para otimizar o desempenho, resultando em maior eficiência.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
- ALBUQUERQUE, Antônio Luiz Porto; SILVA, Léo Fonseca e. Fatos da História Naval. 2.ed. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da Marinha. 2006.
- STRAUSS, Barry. A BATALHA DE SALAMINA: O combate naval que salvou a Grécia e a Civilização Ocidental – Rio de Janeiro: RECORD. 2007.
- RODGERS, Willian Ledyard. Greek and Roman naval warfare. Annapolis: Naval Institute Press, 1964.
- JUNIOR, Haroldo Basto Cordeiro. DE ARS BELLUM. O estado da arte bélica no inicio do século XX. Revista Marítima Brasileira, Rio de Janeiro, v. 121, n. 01/03, jan/mar. 2001.
- 5. SOBEL, Dava. Longitude. A verdadeira história de um gênio solitário que resolveu o maior problema científico do século XVIII. São Paulo. Editora Companhia de bolso, 2008.
1 Período compreendido entre a invenção da escrita e a queda do Império Romano Ocidente 476 d.C
Outra grande descoberta que ajudou no desenvolvimento da navegação foi a melhoria na dieta da tripulação, pois ao serem introduzidos alimentos ricos em vitamina c, houve queda na taxa de morte da tripulação, que perecia de escorbuto, basicamente causada por falta de vitamina na comida.
Legal, hein?😀
Detalhe desimportante, quase inútil: em Star Trek – Into Darkness, 2013, o personagem de Benedict Cumberbatch, Khan Noonien Singh, é apresentado inicialmente como sendo um terrorista chamado John Harrison, uma infeliz mas claríssima referência ao ilustre britânico criador do cronômetro naval.🧐