Grumman S-2D Tracker

Na foto acima, um Grumman S-2D Tracker com o radar de busca e o ferrão do MAD estendidos e a baia de armas aberta. Quatro torpedos antissubmarino Mk.43/44 aparecem sob as asas


O bimotor a pistão Grumman S-2 Tracker foi um avião antissubmarino embarcado que atuou durante a Guerra Fria a partir de navios-aeródromo da Marinha dos EUA e também de países aliados (Brasil incluído). Ele operou tanto embarcado quanto a partir de terra.

As diversas versões do Tracker possuíam quatro tripulantes: dois pilotos e dois operadores de equipamentos eletrônicos, para detectar, rastrear e destruir submarinos. Os equipamentos eletrônicos foram evoluindo com as novas versões do avião, que operou na US Navy até ser substituído pelo S-3 Viking em meados dos anos 1970.

S-2 Tracker da Marinha Real Australiana com o MAD estendido para detectar anomalias magnéticas que indicam a presença de um submarino mergulhado
O porta-aviões antissubmarino USS Valley Forge (CVS-45) com o convoo repleto de Trackers, escoltado por destróieres do Destroyer Squadron 36, no Oceano Atlântico, em 1958. Os porta-aviões convertidos para a missão exclusivamente antissubmarino eram o componente principal dos chamados Grupos de Caça e Destruição (Task Group ALFA)

O Tracker operava de dia e noite em grupos de 6 a 8 aeronaves, em conjunto com os navios escolta e helicópteros antissubmarino.

Cada Tracker fica responsável por um setor à frente da Força-Tarefa, que ele cobria com radar de busca e com o lançamento de sonoboias que transmitiam em tempo real aos operadores a bordo do avião os ruídos detectados abaixo d’água.

Quando um Tracker detectava um ruído suspeito, lançava um padrão de sonoboias com fumígenos para triangular o alvo e obter sua posição mais precisa e, finalmente, empregava o sensor MAD (Detector Magnético de Anomalias), que ficava em um “ferrão” na cauda. O MAD era estendido no momento da confirmação final da posição (chamada de Datum) do alvo.

Dois destróieres cercam um submarino mergulhado enquanto um S-2 Tracker dá um rasante com o MAD estendido para confirmar a posição do submarino

Veja a seguir um relato de um operador de sensores Keith Odom de um S-2G do Esquadrão VS-27 da Marinha dos EUA:

Keith Odom era um operador acústico no VS-27, tendo feito três desdobramentos a bordo do porta-aviões USS Intrepid (CVS-11) entre 1971 e 1973. Ele foi treinado em um S-2D. Seu primeiro desdobramento foi em um S-2E. O Esquadrão dele tinha S-2G.

“O S-2G tinha um sistema Jezebel de sonoboias atualizado. O original tinha um rolo de papel que registrava os ruídos de 4 sonoboias. Já o novo sistema mostrava 4 sonoboias no papel e 4 em um mostrador digital com um total de 8 sonoboias monitoradas. Você podia selecionar o papel ou o display digital para monitorar uma boia em particular.

Um S-2 Tracker voa baixa estendendo o MAD enquanto dois helicópteros mergulham seus sonares em busca do submarino. Ao fundo, um destróier FRAM observa a caçada

Qualquer assinatura interessante tinha que ser registrada em papel. Então se você detectasse alguma coisa no display digital, você chaveava imediatamente para o papel para registrar o que você estava vendo. Como eles gostavam de dizer, o trabalho não está terminado até que a papelada seja feita.

A bordo do navio-aeródromo havia o ASCAC (Anti-Submarine Command and Control or Anti-Submarine Classification and Analysis Center ou Anti-Submarine Combat Activity Center) que catalogava e armazenava todos os rolos de papel com registros de sonoboias fornecidos pelos aviões.

Mais tarde, usando marcações de tempo, um dos postos de monitoração no litoral do SOSUS podia comparar os registros impressos para identificar uma assinatura em particular. A correlação identificava o que você ouviu e onde ele estava. Podia ser um submarino saindo de uma base no norte da Rússia ou um deixando um porto em Cuba: o som se propaga a distâncias muito longas  no meio líquido e a água do mar é um dos melhores.

Operador de sonoboias a bordo de um S-2 Tracker

Enquanto estava no VS-27, eu tinha o melhor piloto nesse tipo de missão, capitão de corveta Gordy Bonnel. Ele e eu passamos juntos pelo treinamento no RAG (Replacement Air Group) e eu era o seu número 4 desde o primeiro dia no Esquadrão.

Ser o número 4 significa operar o sistema acústico chamado Jezebel ou “bitch”. Um dos sons que detectávamos era o de baixa frequência gerado pelos hélices dos submarinos. Analisando o ruído podia-se diferenciar entre 3, 4, 5 e até 6 pás de hélice. Quanto mais baixa a frequência, mais longe o som se propagava.

Você podia estar no Atlântico Norte e escutar um navio saindo de Cuba. O som na água vai longe mesmo. E com centenas de navios cruzando o oceano, como diferenciá-los? A maioria tentava comparar as assinaturas com as dos tipos de navios, mas eu não via sentido nisso.

Mas tinha um tipo de assinatura que era certeira. Os navios americanos usavam geradores de 60hz. Os soviéticos usavam geradores de 50hz. Então eu rastreava os submarinos russos pelo que eu chamava de suas “máquinas de fazer sorvete”. Funcionava sempre.

Se você visse um registro no papel de 50hz, era só começar a procurar. Com certeza havia um submarino russo por perto. Mas localizar sua posição exata era um jogo completamente diferente.

Padrão de lançamento de sonoboias

As sonoboias eram usadas para obter a localização precisa. Elas funcionavam em duas profundidades, 60 pés (18,3 m) e 300 pés (91,5 m), se eu me lembro bem. Nos oceanos, as termoclinas são camadas de água com diferentes temperaturas. Submarinos possuem termômetros nos cascos para que eles possam detectar as diferenças de temperatura e permanecer abaixo da termoclina. Assim fica muito difícil detectar o submarino porque as ondas sonoras são refletidas na termoclina, como acontece com o som em uma parede. Então não era um trabalho fácil detectar esses pequenos vermes. Mas o desafio me motivava.

Nós transmitíamos a assinatura que estávamos vendo ao ASCAC a bordo do navio-aeródromo. Lá eles analisavam o registro tomando um café, sem a perturbação de uma aeronave extremamente barulhenta, e podiam colocar seus olhos calibrados sobre a assinatura e ver coisas que a gente a não tinha visto ou mesmo confirmar o que estávamos vendo.

Quando eu encontrei o “submarino de interesse”, eu estava rastreando uma assinatura de 50hz. Ela era muito firme e clara, indicando que estava próxima. Informei ao piloto Gordy e lançamos várias sonoboias em várias profundidades. Então eu peguei a melhor assinatura e nós começamos a varrer aquela área.

Era um tiro no escuro, porque ele estava registrando em todas as sonoboias, especialmente nas de 60 pés de profundidade.

Console de sonoboias e radar de um S-2 Tracker
Console do MAD de um S-2 Tracker
Padrão de busca do MAD

Nosso copiloto era um canadense chamado Brian MacClean. Nós estávamos trabalhando a 100 pés de altitude (30 metros) quando ele gritou, “ali está ele” e tirou uma foto do alvo. O submarino imediatamente mergulhou mais fundo e não foi visto novamente, embora tenhamos registrado sua presença por horas. O ASCAC confirmou o alvo e acionou outras aeronaves.

Após o pouso a bordo, houve um alvoroço. Nos tornamos celebridades. Quando o almirante foi informado disse: “se eles encontrarem um submarino, vou morder o meu prato”. Eles trouxeram a foto do submarino em um prato de papel. Parece que ele comeu um pedaço do prato de papel, de acordo com o piloto Gordy, que estava lá.

Como estava cansado, eu fui para o beliche, para ser despertado quatro horas mais tarde para colocar o traje de voo novamente. Fomos para a sala de briefing e o restante da tripulação estava lá com os olhos vermelhos. Parece que a esquadrilha que tinha nos rendido perdeu o submarino.

‘Como 8 aeronaves perdem um submarino cujo registro estava claro, como se estivesse se deslocando com pressa para determinada área?’

Fomos destacados com a tarefa de encontrá-lo novamente.

Quando recebemos os quadrantes de busca, descobrimos porque eles o perderam. Eles não estavam buscando no lugar certo.

Então, nosso piloto Bonnel ignorou seu plano de voo e foi direto para a área onde o alvo deveria estar. Nós o detectamos e começamos a rastreá-lo novamente.”

Armas e equipamentos do Grumman S-2 Tracker

FONTE: Livro Grumman S2F/S-2 Tracker Part One, por Robert J. Kowalski e Tommy H. Thomason

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Marcos10

Como estão as modernizações dos nossos?

Esteves

Gerúndio.

MMerlin

A MB está querendo deixar o programa cair no esquecimento, para ninguém perceber o erro, mas os editores e comentaristas do PN não vão deixar, rs.

Esteves

Esse é + 1 fantasma…Phalanx.

Satyricon

Exatamente

Sensato

A notícia que eu desejo desse programa é que a MB encontrou um comprador interessado nas aeronaves e que elas seguirão direto para esse comprador assim que terminar a modernização.

Foxtrot

Estão como tudo no Brasil, a passos de centopeia perneta.

Esteves

“O Tracker operava de dia e noite em grupos de 6 a 8 aeronaves, em conjunto com os navios escolta e helicópteros antissubmarino.” Mais as sonoboias. Mais as tripulações. Mais o treinamento. Mais os exercícios. Para caçar um verme vermelho que poderia estar em Cuba ou na Rússia. Quanto custava e quanto custa manter essa paranoia? Se o submarino não for atacado após X horas de perseguição, irá. Irá para o Iran talvez. Cansado de ser perseguido. Não sem motivo chamavam o sistema de bitch…e o ferrão no Tracker não deixava dúvidas. Como nos metemos nisso nos anos 1970/80? Montaram… Read more »

Esteves

Esteves está rezando pela alma desses…12 negativadores para que suas almas não pereçam no inferno mas tenham vida…sabe lá Deus aonde.

Esteves

Mais.

13. Não rezarei por nenhum mais.

Esteves

Ok…ok…14 é um bom número. 1+4=5. 5 é o número da harmonia, do equilíbrio. Assim como Jesus perdoou 14 discípulos…pedirei ao Pai que tenha piedade e…não despedaçados sejam. Somente atirados aos porcos depois de salgados.

Ave.

Dalton

“Como nos metemos nisso nos anos 1970/80?” . Esteves, havia uma grande preocupação com a crescente força de submarinos da URSS então alinhados como estávamos com os EUA fazia sentido investir os parcos recursos disponíveis na especialização em guerra anti submarina para o que se projetava como uma repetição dos fatos ocorridos entre 1942 e 1945. . No fim da década de1950 um NAe como o “Valley Forge” era efetivo contra os submarinos existentes, com aeronaves e parte dos navios de escolta operando distantes do NAe, mas isso foi mudando gradualmente a medida que submarinos mais avançados surgiam. . Eventualmente… Read more »

Esteves

Calma, Dalton. Muita calma. A preocupação após a segunda guerra foi mais na Europa. Pacto de Varsóvia, os territórios que os alemães perderam, o muro, Berlim, Alemanha dividida, primaveras de 68 nas repúblicas do Leste Europeu, OTAN, corrida nuclear, corrida espacial, Lua… Entramos na década de 1960/70 com Cuba, mísseis, espiões, golpes nos países com tradição golpista, China, mundo dividido entre Leste e Oeste + tudo que está no parágrafo 1 e…esquentando. Nós escrevemos nossas doutrinas à partir das ameaças vermelhas que ameaçavam os norte-americanos. Certo? Quando foi que a URSS apresentou uma ameaça ao Brasil? Che e Cuba é… Read more »

Dalton

Esteves por razões históricas o Brasil estava alinhado com os EUA então na eventualidade de um conflito dificilmente o Brasil ficaria neutro e havia sim preocupação dos submarinos soviéticos tentarem isolar a Europa da América. . Essa ideia de que um país é totalmente independente, “amigo de todos” na prática não funciona, daí alianças de todo o tipo. Certo ou errado, aí vai do gosto do freguês, o Brasil e tantos outros posicionaram-se. . Você parece ser um crítico da compra do “Minas Gerais” e dos “Trackers” mas eram meios válidos para “caçar” submarinos e na eventualidade de um conflito… Read more »

Esteves

Grato.

Esteves, por vezes, visita Lacan e os discursos.

Obrigado, mesmo, pelas respostas.

Esteves

Historicamente, lembro do Juca. Brasil já vai pra guerra, comprou porta-aviões… Esteves lamentou em postagens mais antigas quando o brilhante Dalton frisou que o 31 de Março veio em 1964…8 anos após o Minas e que não existiriam ligações entre os fatos. “Ao embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Lincoln Gordon, Juscelino chegara a confidenciar: “Sei que este é um brinquedo inútil, um navio que não serve para nada. Mas a Marinha tentou impedir a minha posse. Se o preço da submissão da Marinha à Constituição é o porta-aviões, acho que vale a pena”.” Militarmente leio da nossa dificuldade com… Read more »

Esteves

Esteves esqueceu. Atendemos os anseios e ficamos submetidos…submetidos por conta do acordo militar…a entender a Marinha de Guerra como uma Marinha com capacidade para projetar poder como vitamina da CF de 1988. Empregar o poder naval. Niterois para guerra anti-submarina. NAes. Aviação embarcada. Submarino nuclear. Mansup. Aqui está a Guerra das Malvinas que…vamos usar da sinceridade. Vamos sim. Alguém poderia ter influenciado os generais na Argentina? Esteves escreveu que a MB sempre Esteve correta perseguindo esses objetivos já que mísseis ucranianos também estão confirmando o que passou nas Malvinas. Mas. Assim como os argentinos não foram capazes de sustentar a… Read more »

Mk48

Brilhante comentário. Nota-se claramente que você tem muito conhecimento do assunto, tanto teórico como prático. Certamente é um especialista em ASW. Em qual unidadexda MB serviu ? Onde acumulou tanta sapiência mo assunto ?

Esteves

MK. Sumido MK e seus mkazinhos. Tudo bem com você?

Dalton

Na quarta foto de cima para baixo é possível ver o “destroyer” classe Fletcher USS Murray convertido em “destroyer de escolta” DDE 576 tendo parte do armamento retirado e no lugar do canhão de 5 polegadas na posição “B” há uma arma anti submarina “Alpha” lançadora de foguetes que eventualmente seria substituída na US Navy pelo lançador ASRoc óctuplo.

Varg

A US Navy não tem plano de um substituto para os Viking?

Piassarollo

Varg, o S3 Viking não opera mais na US Navy a muitos anos, e seu substituto foi o helicóptero ASW SH70.

Leandro Costa

Os Viking chegaram à ser oferecidos ao Brasil quando foram aposentados.

Foxtrot

Eu acho que a Desaer deveria estudar uma versão embarcada de seu ATL-100 para substituir o S2.
Por mais que hoje haja aeronaves como o P3, P8 etc, nada como uma aeronave embarcada e turbo hélice.
Não entendo o porquê a MB ainda não realizou estudos em sistemas como sonobóias, Sonares aero transportaveis,
Etc que operou e estão desatualizados.
Assim diminuiria o tempo de desenvolvimento de um sistema moderno nacional baseado nos antigos.

Net 7 Mares