Fez bem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em submeter o texto do Plano Estratégico de Defesa ao Conselho Nacional de Defesa antes de tomar uma decisão a respeito. Quer o presidente da República que alguns pontos do plano sejam debatidos com maior profundidade. De fato, um documento cujo escopo é o planejamento da defesa do País, elaborado por um pequeno grupo de ministros – presidido pelo ministro da Defesa, coordenado pelo ministro de Assuntos Estratégicos e composto pelos ministros da Fazenda e do Planejamento e pelos comandantes das três Forças -, não pode ser aprovado sem um amplo debate.

Até porque, como afirmaram à Folha de S.Paulo dois oficiais que participaram dos trabalhos do grupo, o documento contém idéias “realistas, amalucadas e inexeqüíveis”. De fato, pelas informações fornecidas pelo ministro Mangabeira Unger em várias entrevistas depreende-se que o Plano Estratégico de Defesa é uma carta de intenções, nem sempre consentâneas com as reais necessidades e possibilidades do País. “Quando o plano for lançado, será atacado por formadores de opinião”, antecipou o ministro. “Vão acusá-lo de desperdício de dinheiro e de ser instrumento armamentício (de uma corrida armamentista).”

Pelo esboço até agora divulgado do plano, não há como acusá-lo de desperdício de dinheiro, uma vez que não há dinheiro para executá-lo. É um plano inexeqüível. Começa pela meta da elevação do orçamento militar de 1% do PIB para 2,5%, sem a preocupação de corrigir os problemas estruturais que deixam as Forças Armadas em situação de virtual penúria. Elas estão desaparelhadas não é por falta de dinheiro. Recebem o segundo maior quinhão do Orçamento da União, abaixo apenas do Ministério da Saúde. O problema é que, tal como está organizada a carreira militar, as despesas com pessoal, na ativa e na reserva, absorvem quantidades crescentes de recursos – que não sobram para a necessária compra de armas e o adestramento da tropa. Hoje se gasta com pessoal cerca de 80% do orçamento, participação que vem aumentando, ano a ano, há mais de duas décadas.

Pretende-se, ainda, conceder incentivos fiscais a empresas nacionais produtoras de armamentos para que as Forças Armadas não dependam de fornecedores externos. A criação de uma autarquia militar não passa de uma utopia. Nem a poderosa máquina militar norte-americana é auto-suficiente. Depende de componentes e de sistemas de armas completos, comprados de terceiros países. E como poderá um país como o Brasil, que mal reúne recursos para encomendar duas dúzias de aviões para a Força Aérea, montar uma indústria para projetar e construir caças de quinta geração? Como exercício de whishfull thinking o tema é excitante – mas a sua implementação esbarra, primeiro, no impedimento orçamentário e, depois, na dificuldade praticamente intransponível de encontrar parceiros que nos transfiram tecnologia militar de ponta.

Outro ponto a considerar no Plano Estratégico de Defesa é o modelo de serviço militar que o ministro Mangabeira Unger recomenda para o Brasil. Ele preconiza a volta ao serviço militar universal, agora também para mulheres: “Em um País tão desigual, uma das utilidades do serviço militar obrigatório é servir como nivelador republicano, em que a nação fique acima das classes.” É a velha idéia, nascida na Revolução Francesa, da “Nação em armas”, promotora da coesão nacional, que pouco sentido tem hoje, numa sociedade integrada por uma rede de ensino universal e ligada por meios instantâneos de comunicação.
Além disso, a idéia é objetivamente inexeqüível. Hoje, o Exército, com um efetivo de cerca de 220 mil homens, não incorpora mais de 70 mil recrutas por ano – os outros são engajados por períodos de até 8 anos – e, com isso, preenche suas necessidades. O ministro sugere que os jovens que não forem incorporados à tropa sirvam a um “serviço social obrigatório”, trabalhando em regiões diferentes de onde moram. Ocorre que, segundo dados oficiais, existiam, em 2007, 2.110.996 homens e 2.076.135 mulheres com 18 anos. Imagine-se o custo de alojar, vestir, alimentar e transportar esse enorme contingente – privando o País, ademais, de sua força de trabalho e adiando compulsoriamente, por um ano, as expectativas de realização pessoal desses jovens.

FONTE: O Estado de São Paulo

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Ozawa

Tava demorando… Bem, o ‘Estadão” representa o estabelishment da “Av. Paulista”, do “Jardins”, da FIESP, e, assim, tudo que envolva investimento público, em qualquer área, será objeto de críticas. A comparação com o Ministério da Saúde foi apenas uma ardilosa licença retórica para demover eventuais espíritos favoráveis ao fortalecimento da política de defesa. Deus nos livre de eventuais colapsos na área de segurança pública, como ocorrida em São Paulo no ano de 2006, segundo consta, capitaneado por conhecido grupo criminoso. Num instante desses, essa mesma elite será célere em invocar – pela mesma mídia – a presença das FFAA, sucateadas… Read more »

molleri

Esse “Plano” é um feto anecéfalo.

Diego

Nossa, não concordo com quase nada da crítica feita ao PDN. Mesmo não tendo tempo pra elaborar uma réplica aqui, acredito que consigo tecer opniões em relação à dois pontos. Sobre os 80% com gasto de pessoal, acredti que só haja uma solução apenas para o referido “problema”… diminuição dos quadros…. uma vez que qualquer alterção da remuneração ou diminuição da capacitação é inviável (As forças já operam no seu limite). Sobre os incentivos fiscais á indústria bélica nacional….. re-leia o PDN… ele busca fortalecimento e maior independência da indústria bélica nacional… não completo isolamento….. tranferência de tecnologia é possível… Read more »

Pedro Rocha

Olá senhores! Realmente só vou comentar alguma coisa do plano 07/09 quando o mesmo for divulgado! Porém por mais que o jornal não seja uma fonte confiável (para alguns), gostaria de destacar as seguintes palavras “realistas, amalucadas e inexeqüíveis”. Não sei os senhores, mas para mim consigo associar cada uma dessas palavras ao seu autor dentro do plano. Idéias realistas com certeza vieram dos comandantes militares, idéias amalucadas grande participação do ministro goiabeira e por fim idéias inexeqüíveis o Ministro Jobim. Não quero falar nada sobre realidade e inexeqüibilidade, pois acredito que uma explica a outra, mas gostaria de falar… Read more »

Leo

É melhor um plano ruim, que pode ser reformulado, do que plano nenhum. Não gosto deste governos corrupto e demagogo. Mas a iniciativa de fazer um plano é louvável. É assim que funcionam as organizações públicas e privadas em países sérios.

Leo

Ozawa

Sem prejuízo das críticas eventualmente pertinentes ao PND, em especial, sua “revisão” extemporânea. Setores da mídia, como o citado, não objetivarão sua melhora como observamos neste blog, e sim, sua revogação pura e simples, fundando-se para tanto em amontoados desconexos de ilações, comparações, implicações, incutindo nas mentes e corações das massas populares a reprodução de sua opinião publicada. Sua soberba e jactância em tempos de paz não permite reconhecer a necessidade de se estabelecer diretrizes para transferência de recursos às FFAA, tivesse ainda o PND a redação mais brilhante, lógica e sistematicamente, fundamentada do mundo ! Seu intento é financeiro.… Read more »

Nunão

Só um reparo, Ozawa: no caso específico da FIESP, eles querem mais é que o orçamento da Defesa, especificamente a rubrica destinada às compras por aqui, cresça. Daí os COMDEFESA e Grupos de Trabalho etc que se comunicam com a ABIMDE. Não dá pra dizer se a linha editorial do OSESP está alinhada a isso que estou citando, ou ao que vc diz. Mas dá pra fazer mais de uma leitura do fato de estarem cutucando a ferida dos 80% do orçamento gasto com pessoal.
Enfim, há muitas leituras possíveis…

Julio

Pois é, nem divulgaram o PND e a imprensa já consegue editar uma matéria baseada no depoimento de 2 supostos oficiais…onde está a responsabilidade da impresa ao emitir juízo de valor, a imprensa deveria divulgar a noticia e nada mais. Por outro lado, a mediocridade do presidente para tomar decisões sérias e em prol do país e a ideologia polita de seus assessores (Sergio Carvalho, Amorim, Marco Aurelio) que estao acima do bem na nação impedira o Brasil de efetivamente colocar em pratica o PND, mesmo quando aprovado pelo Conselho de Defesa…quando e se aprovado! Para ainda mais trágico…acho que… Read more »

Ozawa

Salve Nunão ! Tenho reservas acerca das reais intenções da FIESP nesses GT’s, assim, ainda sustento minhas conjecturas a respeito da matéria. Inobstante, ponderações como as suas apenas enriquecem o debate !

Douglas

É…. se a imprensa critica.. a imprensa não presta, é soberba…..
é proibido criticar.. tempos díficies estamos vivendo aqui na america do sul.
Só um recado: se há comprometimento do governo com o reaparelhamento, o governo, que é governo, que execute.
Não transfiram responsabilidades não.
Em um ano e meio esse governo terá acabado, talvez eleja o sucessor mas o tempo de Lulla estará no fim. Não esperem plano sério na véspera de eleição.
Continuo aguardando.

Nunão

Ozawa, vc está certíssimo em analisar as coisas com reservas.

Bom, falando em reservas, e com o perdão do trocadilho meio besta, tem ainda a questão das “reservas de mão de obra”, o que certamente é uma parte do plano que não agrada gregos e troianos (o que é pra lá de óbvio, do ponto de vista empresarial) e está patente nesse trecho:

“Imagine-se o custo de alojar, vestir, alimentar e transportar esse enorme contingente – privando o País, ademais, de sua força de trabalho e adiando compulsoriamente, por um ano, as expectativas de realização pessoal desses jovens”

Fábio Max

Está acontecendo tudo o que a politicalha quer.

Eles querem que todo mundo fique de bla-bla-blá sobre o tal plano, que ele fique polêmico ao extremo e que haja muita discussão inútil… isso tira o foco da urgente necessidade de reaparelhar as forças, coisa que eles não querem fazer, porque nas forças armadas, a possibilidade de ter “jabá” e “comissão” é muito menor que em obras civis ou programas sociais.

Fred

Estou muito enganado, ou alguém havia mencionado que o plano seria atacado pelo lobby estrangeiro?

Jorge

Será que MOENDO os nossos (credo em cruz) políticos (esquerdopatas incluídos), pode dar um caldo para uso em guerra bacteriológica?

De repente a gente tem um armamento perigosíssimo e não estamos usando.

André

Afinal de contas, como podemos discutir sobre esse PND se o mesmo sequer foi divulgado, ainda que apenas para o conhecimento da sociedade, até porque está pendente de um análise do tal Conselho Nacional de Defesa, como determinou o Lula? Acho que tínhamos o direito de saber o teor desse Plano, mesmo que sequer um dia ele seja executado.
No mais, penso que se a coisa demorar muito nesse Conselho somente um próximo governo, seja de que partido for, é que o executará, ou não…

João-Curitiba

Quando foi para adquirir o Aerolula, nosso presidente foi rápido e a verba saiu na hora. De bobo ele não tem nada. Acho que ele está seguindo aquela máxima do Getúlio Vargas: se quer que alguma coisa saia do papel, delegue a alguém de confiança a missão e cobre resultados periodicamente. Se não quiser que saia, nomeie uma comissão de alto nível. No caso do PND, o pessoal de confiança foi o Jobim e o Mangabeira, com os chefes militares. A comissão de alto nível é o Conselho Nacional de Defesa. Tem caroço nesse angu.

Patriota

Mauro e Osawa! Perfeito o “post” dos senhores. Quem precisa de inimigos externos com esta grande mídia que temos?

Pinchas Landisbergis

Inexweuivel ou não , o Brasil não tem escolha, ou se arma ou se entrega aos caprichos de quem está armado e tem voz ativa.
Pelo menos é um Plano , um começo do que antes não existia.
Politicagem à parte, 2,5% do PIB não é nehum exagero, ainda mais que rentornará em termos de off-sets e desenvolvimento da industria nacional gerando empregos, renda e capacitação tecnologica a par das novas descobertas que temos a obrigação de defender.

Ozawa

Na esteira de eventual comentário que afirme estarmos aqui proibindo a imprensa de criticar, esclareça-se que a tônica deste blog é o processo dialético, daí, as contradições decorrentes das idéias postadas são, por natureza, necessárias. Por seu turno, a imprensa, um seu segmento e seus leitores, que previnam-se de eventuais críticas às suas matérias, como se absolutas fossem, contradizem-se, na medida em que limitam a terceiros a liberdade de opinião que a si invocam para emitir juízo de qualquer ordem sobre qualquer assunto. E é bom que assim seja, para ambos os lados, afinal, a liberdade de expressão, e de… Read more »

Gunter

A grande midia navega sempre no mundo da ficção, do subterfúgio, espalhando mal-entendidos e mentiras, com uma finalidade bem específica. E o pior é o modo como mente, usando de um contexto deliberado para afetar, infernizar, dividir, iludir, corromper, tendo como objetivo minar a confiança da sociedade contra qualquer Governo que nao faça parte do seu estabelishment . Tais mentiras são injustas e imorais, pois vão contra o interesse público. A mídia escreve mentiras “acreditando” no que lhe convém, no que a beneficia. Portanto virou uma moeda de troca, em vez de ser meramente informativa. Suas reportagens possuem o teor… Read more »

CorsarioDF

Concordo com os senhores, assim como o governo, nossa mídia também vende a mãe a quem pagar melhor!!! E repito com os senhores “A Burguesia FEDE”.

Igor

A grande mídia, a mídia corporativa…

konner

[” Mauro em 16 Set, 2008 às 16:39 “]

[” Ozawa em 16 Set, 2008 às 17:29 “]

[” Gunter em 17 Set, 2008 às 8:28 “]

BRAVO !!! BRAVO !!!!! BRAVO !!!!!!!

Douglas

Não vou falar muito mesmo, porque não há mais o que falar, vcs não acham???
Na primeira reunião Jobim estava com dores na barriga e foi embora. Unger diz que o plano será criticado etc e tal, o Jobim diz que as companhias estrangeiras vão sabotar o plano.. etc.e tal…. mas cade o plano??? Quando “frances” Jobim e o “russo” Mangabeira se entenderem acho que sai alguma coisa. O lobby ta correndo…. Torço para que não haja corrupção.

Baschera

Caro Douglas,
Pode torcer deitado, para não cansar. Este filme é velho…..
Sds.

Farragut

Alguém saberia dizer se o plano trata dos recursos humanos ATUALMENTE efetivos nas FFAA?
Não pergunto sobre vencimentos, falo de capacitação de TODOS os militares para uma eventual mobilização e da valorização dos militares que REALMENTE são operativos e que diminuem os efeitos do sucateamento do material.

luiz pinelli neto

Dinheiro !
Só não será possível a realização do plano estratégico de defesa, se faltarem recursos orçamentários/financeiros que a falta de consciência governamental retirar do Fundo de Reserva das FAs. Vide o tamanho territorial do Brasil, vide o tamanho do efetivo das nossas FAs, e vide os nossos falsos aliados, os bandidos internacionais que cobiçam nossas riquezas, isto tudo somado exigem um constante fortalecimento militar para a “vida toda”. Dez (10) anos são insuficientes. Entendo que a classe dos militares do Brasil deve, imediatamente, exigir o cumprimento integral do Plano Militar. OK. Luiz

luiz pinelli neto

Por que a IVECO? Por que assinar um contrato com a IVECO para construção de blindados sob rodas? A falta de dinheiro é uma coisa presente nas finanças do Brasil, mas burrice é outra coisa!! Vejamos temos ainda vivas a AVIBRÁS e a IMBEL. A AVIBRÁS recentemente construí o Guará, blindado de 4×4, mas o EB não se interessou. Quem mostrou competência para fazer um 4×4, certamente, poderá fazer um 6×6, um 8×8, ou até um 10×10. Repito o que disse, nossos engenheiros militares são muito competentes. Se por acaso, for necessário assinamos, um acordo militar com a Alemanha ou… Read more »